Prof. Dr. Argemiro Luís
Brum
(CEEMA/DACEC/UNIJUI)
22/09/2013
A GUERRA COMERCIAL E OS
EUA
Durante
a chamada “guerra fria” (1946-1991), quando EUA e União Soviética disputavam a
hegemonia política e econômica, o mundo viveu grande parte do período sob
regime comercial protecionista. Ou seja, apesar dos esforços do então Acordo
Geral de Comércio e Tarifas (GATT) em abrir o comércio via rodadas de
negociações multilaterais (envolvendo todos os seus países membros) o mundo
encontrava dificuldades para liberar o comércio. Aliás, tem sido assim
historicamente: em épocas de conflitos e crises globais a tendência sempre foi
o comércio mundial diminuir, pois os países partem para ações protecionistas em
favor de seus mercados internos. Com a implosão do império soviético em 1991 os
EUA ficaram praticamente sós no mundo para exercer sua hegemonia. Foi o momento
em que, iniciada em 1986, a
lógica do livre-comércio, com base nas teorias neoliberais, avançou
significativamente. Diferentes blocos econômicos surgiram, dentre eles o
Mercosul, e as ações multilaterais em favor de um comércio sem protecionismos
se multiplicaram. Neste cenário nasceu a proposta da Área de Livre-Comércio das
Américas (ALCA), que foi erroneamente bombardeada no Brasil antes mesmo que se
pudesse discuti-la com propriedade. A atual linha política brasileira terminou
por enterrá-la, sustentada igualmente pela perda de interesse dos EUA na mesma
após o fracasso do acordo entre União Europeia e Mercosul, em 2004. Pois bem,
passados quase 10 anos destes últimos eventos assistimos a uma retomada mundial
em busca de acordos de livre-comércio regionais. O Mercosul e a União Europeia
falam em retomar as negociações para se criar uma zona de livre-comércio
inter-blocos, mesmo que em nosso caso mal tenhamos uma integração econômica.
Por sua vez, os EUA avançam em duas frentes: com a Europa e com a Ásia. Que
estratégia o move nesta direção, dentro do contexto atual de guerra comercial
que vivemos, especialmente depois de 1991?
A GUERRA COMERCIAL E OS
EUA (II)
Tanto
o Acordo de Livre-Comércio com a Europa (Transatlantic Trade and Investment
Partnership – TTIP) quanto o Acordo de Livre-Comércio com a Ásia (Trans Pacific
Partnership – TPP) tem como lógica o óbvio: um país cresce bem mais quando aumenta
suas exportações, ampliando seus mercados. No caso dos EUA, diante do marasmo
provocado pela crise mundial, se busca ampliar o comércio internacional para
dinamizar um crescimento econômico anêmico. Mas há outro grande motivo para
tais iniciativas: conter a retomada futura da potência econômica que é a China.
Provavelmente esse seja o motivo principal! Ocorre que hoje não se pode mais
utilizar as armas comerciais de um passado não tão distante, tipo a manipulação
das tarifas aduaneiras, para bloquear as importações competitivas procedentes
de outros países ou para favorecer produtos de países amigos. Agora, será
preciso harmonizar as normas comerciais dos dois lados do mundo. Normas estas
que têm servido para justamente bloquear o comércio entre países.
A GUERRA COMERCIAL E OS
EUA (III)
Assim,
facilitar o comércio entre duas potências significa aplicar as mesmas regras
para brinquedos, pescado ou produtos financeiros. Hoje, a principal arma na
guerra comercial mundial é dominar e ditar tais normas, pois isso permite
controlar a circulação de riquezas. É por isso que se torna tão estratégico para
os EUA compor um grupo de países, em torno de acordos comerciais de
livre-comércio, com regras comuns, que inclua o máximo de Estados, para poder
se opor à China. A complexidade do processo não deve permitir que os resultados
sejam rápidos (cf. Le Monde, 17/06/13). Mas o jogo começou a ser jogado! E o
Brasil nisso tudo? Talvez espere que, por ter sido um brasileiro escolhido para
Secretário Geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), a partir deste mês
de setembro, possa assumir alguma relevância neste debate internacional.
Todavia, nada indica que estamos realmente preparados, hoje, para jogar tal
jogo. Afinal, nem mesmo a Argentina conseguimos enfrentar quando a mesma burla
o mais simples dos acordos do Mercosul. Além disso, a própria OMC perde espaço,
pois tais negociações estão passando por cima de sua estrutura. Aliás, é por
isso que não teria havido interesse do chamado “mundo desenvolvido” em disputar
a Secretaria Geral da Organização. O multilateralismo estaria claramente
perdendo espaço em favor de um ou dois países hegemônicos, repetindo a história.