Argemiro Luís Brum
04/10/2018
A partir de março passado o mundo assiste a um
confronto entre EUA e China. Na ponta do iceberg aparece a disputa comercial
entre os dois países, com os EUA avançando tarifas alfandegárias sobre um
grande número de produtos chineses, e a China, em represália, realizando o
mesmo sobre produtos estadunidenses, inclusive a soja. Nos últimos dias de
setembro tal conflito recrudesceu quando os EUA passaram a taxar em 10% mais
US$ 200 bilhões de produtos chineses, indicando que tal tarifa passará a 25% a
contar de 1º de janeiro próximo. Um litígio desta envergadura atinge ao mundo
inteiro. Entretanto, isto não preocupa os EUA, pois seu objetivo vai muito além.
Trata-se de uma estratégia para impedir
a ascensão da China como potência global, freando o seu atual desenvolvimento.
Pode ser o início de uma longa luta
pelo domínio global. O objetivo central dos EUA é
frear a investida chinesa de colocar em prática o seu programa de metas “Made
in China 2025”. Um projeto lançado em 2015 que traça diretrizes para colocar a
China entre os líderes industriais em 10 setores considerados estratégicos para
a dominância econômica e geopolítica nas próximas décadas, sendo que 70% do
conteúdo dos bens produzidos nos segmentos escolhidos devem ser fabricados
dentro do país. Um fator, pela dimensão da economia chinesa, que causaria
desestabilização global. Ora, o conflito entre as duas maiores economias do
mundo se constitui em um ataque
direto ao sistema multilateral. Se antes a disputa comercial se concentrava no
câmbio, agora envolve um questionamento da validade de todo o sistema
multilateral de comércio, uma descrença nas organizações internacionais,
particularmente a OMC, mas também OCDE e o G20. Mas há igualmente a questão
militar: a China está se
armando, e estaria desenvolvendo ativamente bombardeiros de longo alcance e
provavelmente treinando pilotos para missões direcionadas aos EUA. Ou seja, esta realidade EUA x China é um dos temas mais importantes
em termos de geopolítica nesta segunda década do século XXI. Se, por um lado, a ação dos EUA vai além de uma simples resposta às
pressões protecionistas das indústrias estadunidenses, incomodadas com a
competição chinesa, se constituindo em uma “tentativa de resistência” ao avanço
da China em seu processo de internacionalização, por outro lado, o que está em jogo é como organizar “uma nova ordem
comercial”, com a presença de um novo ator com poder econômico e militar e que
não adere totalmente aos princípios que as grandes economias ocidentais e mais
o Japão entendem como a ordem liberal a ser preservada (cf. Conjuntura
Econômica, FGV, maio/18, p.48-49). O balanço final deste conflito não será positivo para o mundo. No Brasil,
às vésperas das eleições presidenciais, infelizmente nossos candidatos parecem também
desconhecer este tema.