Argemiro Luís Brum
28/11/2019
A
moeda brasileira registrou R$ 4,27 por dólar nesta semana, acusando uma desvalorização
muito além da conta. E essa não é apenas uma situação conjuntural. Se olharmos
um período de pouco mais de 20 anos, entre junho/99 (quando o Brasil consolidou
o câmbio flutuante) e outubro/19, o Real sofreu uma desvalorização de 40,5% considerando
a Paridade de Poder de Compra. Por esta metodologia, no final de outubro
passado nossa moeda deveria estar valendo R$ 2,91 por dólar e não os R$ 4,09
que foi a média daquele mês. Tomando-se um período mais curto (janeiro/09 a
outubro/19), o Real deveria estar valendo, no final do mês passado, R$ 3,32, ou
seja, 23,2% a menos do que estava na média de outubro passado e 28,3% a menos
do que o seu valor atual. Portanto, nossa moeda está “anormalmente”
desvalorizada. Há motivos externos e internos, dentre eles a possibilidade de
impeachment do presidente dos EUA; a fragilidade geral da economia mundial, com
ameaças de nova recessão; e as recentes dificuldades da economia nacional (em
2020 estaremos fechando a maior década perdida dos últimos 120 anos em nossa
economia). Ora, o quadro cambial é extremamente nocivo e deve chamar a atenção
do governo. Se no curto prazo o setor exportador ganha, enquanto o importador
perde, no médio prazo a situação se complica de forma geral. Primeiro, porque
os exportadores, necessariamente, precisam importar componentes para a
fabricação de seus produtos (e o Brasil importa de tudo um pouco), fato que
deixará sua produção mais cara. Em segundo lugar, mais dia menos dia os preços
internos começarão a subir, refletindo tais importações. A situação somente não
estourou ainda no Brasil porque a crise é tão grande que impede aos produtores
repassarem a desvalorização cambial aos preços finais, pois os consumidores não
têm renda para consumir. Por enquanto, quem pode vai “se defendendo” com as
exportações, a ponto de se incorrer em riscos de desabastecimento em alguns
setores. Ao mesmo tempo, as medidas de disponibilidade de crédito e de
renegociação de dívidas, atualmente adotadas, ao buscarem uma retomada do
consumo, mesmo que tímida, ironicamente podem potencializar o problema. Com
maior liquidez, o setor produtivo tende a aumentar preços visando recuperar
margens perdidas pela desvalorização do Real. Aliás, a situação começa a
atingir os alimentos (carne bovina, por exemplo), pois a exportação se torna a
cada dia mais interessante, sem falar em questões pontuais de demanda (crise da
peste suína na China) que nos favorecem no mercado externo. Neste contexto, a
equipe econômica precisa olhar com mais atenção o que se passa com o câmbio.
Afinal, um choque inflacionário pode vir rapidamente, obrigando a uma reversão
na política de juros, onde a Selic voltaria a subir, interrompendo os efeitos
positivos em favor de uma retomada econômica.